O artigo Parte IVb da série “Sanidade na Criação de Bezerras" abordará protocolos para a detecção precoce, assim como protocolos de tratamento e prevenção das principais doenças que ocorrem durante e/ou após o desmame. A coccdiose é uma infecção do trato intestinal dos bovinos causada pela Eimeria zurnii e Eimeria bovis, adquirida pela ingestão de água e alimentos contaminados com fezes.
A intensidade da coccidiose pode variar de intensa a branda. As manifestações clínicas são diarreia fétida e sanguinolenta (com destruição do tecido intestinal e alteração na absorção do alimento) desidratação, perda de peso, febre e pode levar a morte. O método de diagnóstico mais utilizado é a contagem de oocistos por grama de fezes (OOPG).
A prevenção deve ser realizada durante e/ou imediatamente após a desmama, pois, os animais apresentam o sistema imune enfraquecido devido ao elevado grau de estresse oriundo da transição entre o leite e alimento sólido, além do reagrupamento, socialização e mudanças ambientais observadas neste período. A doença também pode ser observada precocemente na fase de aleitamento, caso sejam criadas em contato direto com o solo. Por este motivo, algumas rações comerciais utilizadas na fase de aleitamento já possuem ionóforos (agentes coccidiostáticos) para a prevenção da coccidiose. Os produtos utilizados para o tratamento e prevenção da coccidiose estão apresentados na tabela 1.
Quadro 1 - Produtos indicados para o tratamento e prevenção da coccidiose.
Ressalta-se que não adianta investir em produtos comerciais se medidas básicas de manejo e higiene não forem consideradas: gerenciamento do manejo de colostro, higiene ambiental, fornecimento de água e alimentos de boa qualidade, evitar umidade excessiva nos bezerreiros assim como a superlotação, realização da segregação e tratamento dos casos clínicos quando houver necessidade.
A verminose é causada por helmintos (vermes internos) que se alimentam de sangue e nutrientes das bezerras. Os principais parasitas dos bovinos são os nematóides que possuem o corpo cilíndrico e parasitam o sistema gastrintestinal: Haemonchus (abomaso), Strongyloides (intestino delgado), Bunostomum (intestino delgado), Cooperia (intestino delgado), Trichostrongylus (abomaso e intestino delgado) e Oesophagostomum (ceco e cólon). Estes parasitas são adquiridos pelo pastoreio e ingestão de água contaminada.
As principais manifestações clínicas da verminose são baixo desenvolvimento, perda de peso, fraqueza, anemia, desidratação, tosse, pelos ressecados e arrepiados, edema na parte submandibular dependendo do grau da infecção, lesões intestinais, fezes pastosas e posteriormente diarreia.
Figura 1 - Lote de bezerras desmamadas com pelos arrepiados, subdesenvolvidas (baixas), abdome distendido e baixo escore de condição corporal. Este lote deveria ser investigado para verminose e coccidiose.
O método de diagnóstico mais utilizado para a detecção da verminose é a contagem de ovos nas fezes (OPG). Para este exame, as fezes devem ser colhidas diretamente do reto (utilizando luva) e armazenadas em coletor universal estéril, as amostras devem ser identificadas com o número dos animais, refrigerada (+2°C a +8°C) e deve ser enviada para o laboratório em uma caixa de isopor lacrada, contendo gelo reciclável. A identificação da propriedade, endereço, pedido de exame, o prazo da coleta até a chegada ao laboratório não deve ultrapassar 48 horas.
A contagem de ovos por grama de fezes pode ser realizada por amostragem (10 a 20% do grupo) para a avaliação da real necessidade em desverminar os animais. Não recomendamos o uso indiscriminado de vermífugos como o rodízio de medicamentos pela ampla resistência que os parasitas têm desenvolvido nas últimas décadas. Após a escolha e aplicação do produto, de preferência com o auxílio do médico veterinário, deve-se aguardar 7 dias e repetir o OPG nos animais amostrados inicialmente para verificar se o mesmo foi eficiente na eliminação dos parasitas. Apenas no caso de resistência deve-se trocar o princípio ativo.
A Clínica de Bovinos e Pequenos Ruminantes da FMVZ-USP realiza a contagem de oocistos e ovos por grama de fezes para os produtores do estado de São Paulo e região. Maiores informações no telefone (11) 3091-7652
A clostridiose é uma doença causada por bactérias anaeróbias que fazem parte da flora do trato gastrintestinal das bezerras saudáveis. A doença ocorre quando há um desequilíbrio e aumento no crescimento das bactérias do gênero Clostridium produtoras de toxinas. Feridas na pele e mucosas também são porta de entrada para esses micro-organismos, sendo assim, medidas de higiene e desinfecção devem ser adotadas para os procedimentos de castração, descorna, auxílio ao parto, vacinação e acesso venoso.
Quadro 2 - O quadro apresenta as principais formas das clostridioses, etiologia e sistemas/órgão afetados.
As principais manifestações clínicas são:
Botulismo: inquietação, incoordenação (andar cambaleante), paralisia dos músculos dos membros, mandíbula, língua e garganta (mastigação).
Tétano: tremores musculares, rigidez muscular e da cauda, orelhas eretas, convulsão, o animal adota uma postura de cavalete, dependendo da intensidade o animal permanecerá em decúbito lateral com a cabeça e pernas em completa esticados, parada respiratória.
Carbúnculos: mucosas congestas e hemorrágicas, respiração profunda e rápida, frequência cardíaca elevada, depressão e apatia, febre alta (41 a 42°C), intensa claudicação, sente dor a palpação, edema e crepitação dos músculos dos membros em consequência a formação de gás, aumento de volume, mucosas secas e congestas.
Hemoglobinúria bacilar: em modo geral os animais são encontrados mortos sem observação de manifestações clínicas, porém, ocasionalmente observa-se dor abdominal, anorexia, depressão, dificuldade ao andar, tremores musculares, urina de cor vermelho escura e fezes com sangue.
Enterotoxemias: dor abdominal aguda, diarreia intensa e toxemia. Para o isolamento e identificação da clostridiose é necessário fazer a necropsia e enviar fragmentos de tecidos de 1x1x3cm de cada órgão afetado em frascos estéril (coletor universal vendido em farmácia humana), armazenado em isopor refrigerado ou congelado. Devido a sua rápida evolução, o tratamento dos animais acometidos dificilmente funciona e consequentemente ocorrem elevados índices de mortalidade.
A prevenção deve ser realizada a partir de vacinações como o esquema a seguir:
- Vacinação de novilhas e vacas (60 e 30 dias antes do parto previsto) para que o colostro produzido tenha anticorpos contra as clostridioses;
- Nas bezerras (filhas de vacas vacinadas) recomenda-se a aplicação inicial de 2 doses de vacina aos 4 e 5 meses de idade. Devem ser realizados reforços anuais.
A carcaça de animais acometidos com clostridiose devem ser enterradas em covas de 3 metros de profundidade, de largura e de comprimento a pelo menos 500 metros de distância de mananciais, para que não ocorra contaminação da água. A carcaça deverá ser coberta por 20 centímetros de terra, seguida de 10 centímetros de cal virgem e fechada posteriormente com terra.
A ceratoconjuntivite infecciosa é uma doença causada por uma bactéria altamente contagiosa Moraxella bovis. Sua transmissão ocorre pelo contato direto, descarga nasal ou ocular e, especialmente, por vetores mecânicos, como moscas. As principais moscas transmissoras são a Musca autumnalis e a Musca domestica, tornando o seu controle uma medida importante para a prevenção desta doença.
As principais manifestações clínicas observadas são lacrimejamento, sensibilidade à luz, e posteriormente o olho fica com uma mancha esbranquiçada na córnea. Se o animal não for tratado precocemente pode ocorrer à formação de múltiplas úlceras e cegueira.
Figura 2 - Bezerras com lacrimejamento e secreção ocular purulenta na fase inicial da ceratoconjuntivite infecciosa.
Figura 3 - Bezerras com opacidade de córnea que confere um aspecto azulado à esbranquiçado para o olho.
Figura 4 - Bezerra com opacidade de córnea que confere um aspecto rosado à esbranquiçado para o olho. Este é o motivo pelo qual os americanos chamam a doença de PINK EYE (olho rosa).
O tratamento recomendado é a limpeza diária do local com algodão e solução fisiológica, aplicação de pomadas oftálmicas ou colírios a base oxitetraciclinas associado à administração de oxitetraciclina por via intramuscular na dose de 20 mg/Kg.
As injeções subconjuntivais com penicilina ou gentamicina também são indicadas, porém devem ser aplicadas com cuidado apenas pelos médicos veterinários. A prevenção e o controle devem ser realizados através da vacinação das bezerras desmamadas, com reforço após 30 dias da primo-vacinação.
Por fim, gostaríamos de ressaltar que o método de desmame e nutrição das bezerras no período de transição são fundamentais para garantir o desenvolvimento e saúde dos animais em fase de desafios múltiplos - que pode resultar em um conjunto de doenças que com certeza comprometerão o desempenho futuro dos animais.
Fonte: MilkPoint.